A pandemia do novo coronavírus impulsionou ainda mais a indústria dos games no País e no mundo. Segundo os dados da consultoria Super Data, braço de inteligência da Nielsen & Company, o mercado mundial de games teve receita 12% maior em 2020 quando comparada a 2019. Já a expectativa para 2021 é que haja crescimento de 2% no faturamento.
Atualmente há projetos de lei que buscam regulamentar a prática esportiva eletrônica, como é o caso do PL 383/2017, em tramitação no Senado Federal, que faz se entender por esporte as atividades que, fazendo uso de artefatos eletrônicos, caracteriza a competição de dois ou mais participantes. Além disso, o praticante de esportes eletrônicos passaria a receber a nomenclatura de atleta.
Como ainda não há uma regulamentação específica para essas atividades, é necessária uma atenção em momentos relacionados a possíveis conflitos que possam surgir no âmbito jurídico pela falta de regulamentação. Muitas vezes, os “cyber atletas” e as equipes profissionais encontram como alternativa para resolver suas questões jurídicas os processos de mediação e arbitragem.
Diante disso, o Jornal da Lei entrevistou o professor de Direito Desportivo e árbitro da Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada (CAMES), Carlos Ambiel.
Jornal da Lei – Quais os possíveis conflitos que podem surgir nessa área?
Carlos Ambiel – São conflitos dos mais diversos possíveis. Alguns na esfera da relação de consumo, daquele que consome o jogo e da empresa que comercializa, entrando numa questão de defesa do consumidor, há também conflitos relacionados à relação de trabalho de atletas de esportes eletrônicos com as equipes que os contratam, o que pode envolver a justiça do trabalho. Há também situações relacionadas aos streamers, que são atletas que fazem lives de jogos que são transmitidas em alguma plataforma na internet, podendo gerar conflitos com as políticas da própria plataforma.
JL – O que são os processos de arbitragem e porque eles são a melhor forma de se resolver essas situações?
Ambiel – Os processos de arbitragem são previstos na legislação brasileira desde 1996, permitindo que, quando houver uma relação conflituosa ou contratual, os interessados na resolução daquele conflito podem, ao invés de ir para o judiciário, escolher que uma solução seja dada por uma pessoa privada, um arbitro, que é um cidadão com conhecimento técnico naquele assunto e escolhido pelas partes. Nosso ordenamento prevê uma alternativa mais tradicional que é o uso do poder judiciário para quando houver qualquer disputa relacionada a relações de trabalho. O problema é que a justiça do trabalho tem sua demora natural. O que nós temos percebido, inclusive na esfera internacional, é que há uma tendência das equipes e dos atletas do esporte eletrônico estabeleceram clausuras arbitrais para levar essa solução a tribunais arbitrais especializados, seja porque há um conhecimento mais especifico da atividade, o que não é muito comum do juiz do trabalho tradicional, mas principalmente porque a arbitragem tem uma instancia única, tornando a solução mais rápida.
JL – Como funcionam esses processos?
Ambiel – Há várias câmaras especializadas em arbitragem no Brasil e fora do País. Você segue o regulamento de uma dessas câmaras com suas regras de arbitragem, taxas e honorários dos árbitros. Dentro delas há árbitros indicados pela própria instituição e, dependendo da câmara, podem ser indicados árbitros de fora. Então, seguindo tanto as regras da lei de arbitragem, quanto as dos regulamentos das câmeras, o procedimento ocorre e a decisão dada por aquele árbitro ou pelo conjunto de árbitros deve ser respeitada.
JL – Quais os benefícios ao recorre a esses processos?Ambiel – Além da rapidez, talvez o grande benefício seja a especialização do arbitro. Uma coisa é eu ter o meu caso julgado por um juiz que, por mais capacitado e qualificado que seja, julga dezenas de assuntos distintos e pode não ser tão especialista naquele assunto específico, outra coisa é ser julgado por alguém que trabalha no mercado, que conhece as peculiaridades e entende a dinâmica e as necessidades de atletas e equipes. São essas duas vantagens.
JL – Como recorrer a esses processos de arbitragem?
Ambiel – A lei define que a escolha da arbitragem como solução de um conflito pode se dar de duas formas. Podendo ocorrer tanto na origem, quanto no momento em que surgir o conflito. Na hora que se firma um contrato, as partes podem dispor nele que qualquer conflito que nasça daquela relação jurídica seja solucionado por uma arbitragem, já se estabelecendo parâmetros relacionados a isso. Outra hipótese, quando surgir o conflito e não ter isso estipulado no contrato, é ser de comum acordo entre os lados interessados se estabelecer um compromisso arbitral fora de contrato.
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